É preciso abrir as escolas urgentemente
Por Elisângela Gonçalves
Desde o início do isolamento social provocado pela pandemia, em meados de março de 2020, muitas são as perdas e os retrocessos com o afastamento das crianças de suas escolas. Com as instituições há mais de um ano fechadas, muitas crianças na faixa etária da Educação Infantil, por exemplo, deixaram de ter os seus direitos de aprendizagem garantidos.
Presentes nas escolas desde o início do ano letivo, as crianças tiveram uma ruptura abrupta e repentina na sua rotina escolar, o afastamento dos seus amigos e dos professores, a perda das experiências vivenciadas e das aprendizagens proporcionadas pelos momentos na escola.
A necessidade do isolamento social trouxe para a vida dos pequenos um novo cotidiano: o de ficar em casa com as famílias que, muitas vezes, estabeleceram o home office ou teletrabalho, compartilhando o mesmo ambiente, as rotinas da casa e o convívio em tempo ampliado. Os desafios então se apresentaram: como manter um ambiente saudável e atrativo para estas crianças, de forma a garantir as condições para o seu pleno desenvolvimento e agregar isso às rotinas e demandas familiares?
Estresse infantil é consequência do isolamento social
Com tudo isso, infelizmente surgiu também uma situação de risco e vulnerabilidade para grande parte das crianças do nosso país, pois muitas não possuem moradia, alimentação adequada, acesso à escola remota, não tem a presença dos pais em casa e acabaram se tornando as maiores vítimas desta pandemia.
De acordo com o Conselho Nacional das Crianças e Adolescentes, o Conanda, grande parte dos brasileiros em situação de rua são crianças e adolescentes, um dado que teve um aumento significativo desde o início da crise sanitária.
Pesquisa divulgada pelo Núcleo Ciência pela Infância (NPCI), em seu artigo “Repercussões da pandemia de Covid-19 no desenvolvimento infantil”, revela que diversos foram os transtornos e as consequências geradas pelo estresse infantil, causado principalmente pelo isolamento social, pelo afastamento da rotina escolar e todas as decorrências destes fatores.
De acordo com a publicação, cerca de 36% das crianças desenvolveram uma dependência exagerada dos pais, 32% apresentam desatenção, 29% se mostraram preocupados e 21% apresentaram problemas com sono, dentre outros problemas citados da pesquisa.
Um dos mais significativos prejuízos para os pequenos foi a perda das oportunidades de interagir com os pares etários. Como educadores, sabemos o quanto é importante para uma criança, nessa faixa etária, interagir, aprender, conviver e se relacionar com os amigos nos momentos de brincadeira na escola.
A educação não existe sem vida na escola, sem a presença das crianças em seu espaço
Sabemos também que essa interação favorece a aquisição da linguagem, a percepção do outro como sujeito, a brincadeira autônoma, e principalmente, promove aprendizagens significativas nas trocas, nas experiências vivenciadas coletivamente. A falta da escola, com certeza, trará grandes prejuízos, em função de todas essas oportunidades que foram perdidas ou que deixaram de ser vivenciadas.
A educação não existe sem vida na escola, sem a presença das crianças em seu espaço. Todas as relações construídas na escola são reais e necessárias para o seu papel social e para o pleno desenvolvimento infantil. Por isso, o retorno para a escola se mostra tão urgente e necessário neste momento.
As escolas, no entanto, não ficaram inertes e procuraram de alguma maneira levar um pouco dessas experiências para as crianças em casa. As que conseguiram se manter na crise financeira causada pela debandada dos alunos tiveram que se adaptar em ferramentas e modelos pedagógicos para suprir as novas demandas. Muitas perderam grande parte de seus profissionais e seguem investindo em protocolos de segurança e higiene, na esperança de uma retomada.
De acordo com Sindicato das Escolas Particulares de Minas Gerais (Sinep-MG), após um ano de portas fechadas, estima-se que 40% das escolas infantis de pequeno porte tenham encerrado as suas atividades por falta de matrículas e por não conseguirem se sustentar, o que pode gerar no futuro, um grande déficit de vagas em creche e educação infantil para este público.
Nas suas tentativas de contato remoto, muitas escolas procuraram evidenciar situações curriculares, interação com os amigos, ainda que virtualmente. Buscou também contato com os educadores, para criação de vínculos e manutenção das experiências escolares levadas de alguma forma para as casas das crianças.
A importância dos vínculos afetivos
O objetivo principal das instituições de ensino sempre foi manter os vínculos afetivos e de pertencimento com a escola, com os professores e com os amigos e, de alguma forma, ainda que virtual, levar também um pouco dos momentos de aprendizagem.
Acreditamos, no entanto que o modelo on-line adotado por muitas escolas não é o mais adequando na faixa etária infantil, o que tem gerado ainda mais estresse entre crianças e famílias.
Sabemos que nada substitui a presença física e a interação viva que acontece na escola. Os vínculos criados e a relação afetiva, o conflitos, o contato e as trocas presentes na rotina escolar. Nada substitui a escola, os professores e os amigos!
Muitas instituições ligadas à infância têm mencionado e indicado a urgência e a necessidade do retorno das atividades escolares para garantia dos direitos das crianças. Muitas não têm sequer a oportunidade de conviver com outra criança da família, não residem em condomínios ou perto de praças ou outro ambiente ao ar livre, não têm um espaço físico adequado para brincar.
A necessidade infantil é premente, de correr, interagir com o outro, conversar, gastar energia e movimentar o seu corpo, explorar o ambiente natural e brincar livremente. A falta disso, com certeza, acarreta num grande distanciamento do que é natural e necessário para o pleno desenvolvimento dos pequenos.
Em artigo publicado recentemente pelo Unicef, Florence Bauer, afirma:
“O longo tempo de fechamento de escolas e o isolamento social têm impactado profundamente a aprendizagem, a saúde mental e a proteção de crianças e adolescentes. O UNICEF pede urgência aos novos governantes municipais para a reabertura de escolas com segurança e a implementação de políticas para garantir o direito à educação, olhando especialmente para as crianças e os adolescentes mais vulneráveis, que foram mais duramente impactados pelos efeitos da pandemia no País”.
A preparação para a retomada das aulas presenciais
Esperamos que o caminho e os próximos passos dos gestores escolares sejam no sentido de organizar as escolas, adequar espaços físicos e equipamentos, capacitar e formar profissionais nos protocolos para uma possível e breve retomada, além de buscar a garantia da vacina para todos.
Nosso papel, enquanto educadores, é torcer para que tudo isso passe logo. Estamos otimistas para que logo possamos exercer com segurança nossa função e garantir o retorno aos empregos de muitos que os perderam; voltar para a escola e poder desenvolver uma proposta que sempre acreditamos e valorizamos: a relação entre adultos e crianças que tanto colabora para a formação de ambos. Que possamos garantir um retorno seguro para nossas crianças e voltar para nossa rotina escolar, colaborando cada vez mais com seu desenvolvimento.
*Elisangela Gonçalves é educadora, analista educacional da SEE/MG e Diretora pedagógica da Escola Infantil Novo Espaço